quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Curitiba, jamais te esquecerei...


Eram mais ou menos 12h08min deste último Domingo, dia 23 Novembro. Virei a curva saindo da rua Presidente Carlos Cavalcanti e entrei na Avenida Cândido de Abreu. A minha frente e abaixo estava uma placa que marcava 41 KM. Coloquei as mãos na cabeça e comecei a chorar. Olhei para o horizonte e avistei a linha de chegada. Eu estava exatos 1 km 195 metros distante de finalizar minha primeira Maratona. Pensei “Não acredito! Eu consegui! Vou terminar essa loucura!!!”

Meus passos, que já não estavam mais tão firmes, se tornaram ansiosos e mais rápidos. Com todo o cuidado que podia ter, eu segui naquele último trecho. O último quilômetro. Tantas coisas passam pela cabeça durante a Maratona inteira, mas naquele quilômetro final as coisas se confundem. É um misto de ansiedade, de dor, de emoção, de lembranças, de realização...

Pensei em muitas coisas. E chorava. Primeiro, de forma contida. Depois eu desabei mesmo. Pensei na minha lesão que me acompanhava e era meu grande medo nessa primeira Maratona ( tive uma fratura por estresse na canela esquerda em Novembro do ano passado. Algo que voltou a me incomodar na preparação para a Maratona). Pensava no último grande treino que eu não fiz, porque falhei em Salvador, na Bahia. Era um treino de 32 kms em que eu quebrei e abandonei no 17º km. Isso foi no final de Outubro. Pensava nas minhas pessoas queridas da vida. Meus irmãos, minha mãe, meu pai, minha família. Pensava nos amigos especiais que foram suporte pra tudo isso. Pensava em meu treinador, que me fez chegar até ali.

Aquele último quilômetro é algo indescritível. O povo de Curitiba fazia um corredor humano de calor. Palavras de incentivo, que foram a tônica durante toda a prova, se multiplicaram ali, naquele corredor. Ia chegando, passo a passo. Cruzei a marca de 42 kms, já entre as arquibancadas construídas ali no funil de chegada. Faltavam 195 metros. Ouvi uma voz distante – “Faraaacooo!!! Era meu parceirão de corridas, daqui do blog, o Marcos Alexandre, com a máquina na mão pra registrar o momento e vibrar comigo.

Lembro de ter acelerado um pouco mais e ter sentido um espasmo, um princípio de câimbra na panturrilha direita. Segurei, porque era tudo que eu não precisava naquela hora. Cruzei a linha de chegada chorando e vibrando, como se estivesse comemorando um gol. Estava sentada a minha frente outra colega, a Adri que disse – “Faraco, tu é o meu herói”. As palavras ficam marcadas. O momento fica marcado. Cada instante fica forte na memória. Caí no choro de verdade e abracei a Adri. Depois veio o Marcos pra me cumprimentar também. Foi sensacional.

A Maratona começou às 8 da manhã. A largada reservava ainda muitos momentos escondidos pelos distantes próximos 42 quilômetros, das próximas 4 horas. Saímos juntos, eu e meu colega de treinos e Maratona, Alexandre. Juntou-se a nós um colega de Florianópolis que eu não sei o nome, mas que foi um parceirão também. Os primeiros quilômetros foram na prevenção. Eu e o Xande éramos maratonistas de primeira viagem, então estávamos nos poupando e com medo de não conseguir finalizar a prova. Corremos pra 6 minutos o quilômetro em média.

Eu tinha uma preocupação especial. Minha canela! Estava com um tênis bem em dia, que era novo, mas que não era apropriado para longas distâncias. Então o início seria fundamental pra sentir como estava a canela e ter confiança. Eu senti me incomodar um pouco, mas já sabia como era administrável a sensação. Não era dor. Era apenas a minha lesão antiga dizendo – PRESENTE! – como se respondesse a uma chamada de colégio. Ela tinha que estar lá mesmo. Mas fui em frente e aos pouco aquilo, o desconforto, foi desaparecendo.

Até o 21º quilômetro segui com o Xande e com o parceiro conhecido/desconhecido de Floripa. Ele era muito engraçado. Xingava cada um dos motoristas que ousava buzinar pra reclamar do trânsito parado na cidade. E discutia e tudo. Só não parava de correr. O Xande parecia minha consciência me dizendo pra ter calma. “Calma Faraco, ainda não é hora de arriscar”. Ele não dizia, mas cada vez que olhava o Xande ali ao lado eu lembrava disso e pensava na frase comigo mesmo. Foi muito importante pra me dar segurança.

Quando passamos na marca do 17º quilômetro eu pensei: “foi pro espaço aquele maldito treino de Salvador!!!”. Pronto! Um dos traumas estava superado. Mas então, quilômetro 21. Neste ponto veio a confiança. Eu estava inteiraço e correndo bem. Tive a certeza de que terminaria a prova. Não sei o porquê, mas foi o ponto da confiança. Então eu desgarrei. Desgarrei do Xande e do parceiro de Floripa. Abri na frente puxando um ritmo mais forte. Estava pra 5 – 5:15 cada quilômetro. Quanta confiança! Era eu comigo mesmo e rumo ao final. Restam só 21, só 20, só 19... Pensava assim!

Mas isso durou até o quilômetro 29. Foi quando quebrei de verdade. Travei geral. Sabe quando se fica travado de musculatura? Mas não era só musculatura não! Eram as articulações também. Agora eu sentia doer cada parte do meu corpo da cintura pra baixo. Principalmente os Joelhos batidos e batidos por 29 quilômetros. Foi difícil, porque sabia que ia acontecer a quebra, mas esperava que não acontecesse. Pelo menos assim, faltando ainda 13 kms.

A partir daí o que conta é o mental. Me recusei a uma coisa – era regra – não podia andar! Tinha que fazer correndo a Maratona inteira! E assim eu fiz. Nem pensei em andar. Minha cabeça dizia: “Eu quero! Eu posso! Eu vou!”. Isso era sempre. A cada instante uma vitória nova. O sol era forte nesse momento. Já era quase 11 horas da manhã e os quilômetros finais reservavam muitas subidas.

Neste ponto da Maratona cada placa de KM novo é esperada com muito mais intensidade. Cada placa de novo KM é uma vitória. Passei a placa 30, vou atrás da 31. Passei a 31, vou atrás da 32. Passei a 32, vou atrás da 33... E assim vai passando. Lembro que na placa 34 tinha uma senhora bem feliz e ela gritava “Vamô gente, vocês são heróis! Parabéns, parabéns! Falta pouco!”. Cada grito desse de incentivo dava uma força enorme.

A prova foi passando e cheguei ao km 38. Não acreditava no que via pela frente. Era a pior subida da Maratona inteira. Estava dividida em DUAS partes no Viaduto do Capanema. Passei por um senhor e comentei – “que covardia que eles reservaram pra gente nesse ponto da corrida, hein!”. Ele respondeu: “Agora é na moral!”. E fomos. Subindo e seguindo um ao outro.

Cheguei ao alto e ouvi uma voz conhecida. Era o Marcos me esperando pra registrar essa foto que vocês podem ver aqui. Lembro que ele me disse: “Vamô cara! Faltam só 3kms e meio para realizar o sonho”. Eu retruquei: “estou morto!”. Mas era passo a passo. Sem parar e sem sequer pensar em parar até o fim - que vocês já conhecem.

Realizar a minha primeira Maratona foi algo extraordinário. Fiz a prova em 4horas 16 minutos e 06 segundos. Ficou um pouco acima do que eu havia estabelecido pra mim, mas a vitória foi terminar. Terminar uma prova como essa é algo que te dá muita força pra vida. Uma satisfação enorme. Uma sensação de conquista e de poder. A superação é tamanha – você esteve sempre acima dos limites do seu corpo. Lembro de ter pensado no tamanho da estupidez daquele desafio lá pelo quilômetro 33. Mas são pensamentos ruins e bons, que vem e vão a todo o momento durante as horas de corrida.

Eu tenho muito a agradecer. Agradeço especialmente aos parceiros Marcos e Alexandre, que foram irmãos de verdade na conquista. PARABÉNS XANDE!!! Obrigado MARCOS!!! Tenho saudações especiais também para o super Paulinho, meu treinador, que faz coisas inacreditáveis se tornarem acreditáveis. PAULO, tu é o cara! Mas a conquista é dedicada a minha família, mãe, irmãos e pai ( todos me ligaram – são uns amores). Ainda há espaço pra palavras de carinho pra grandes pessoas, como o Osni, o Daniel, a Aline, o Victor, a Adri... Todos parceiros corredores, que estiveram comigo nos momentos de treinamentos e com os quais dividi angústias, duvidas e certezas. UM BEIJO NO CORAÇÃO DE TODOS.

Podem ter certeza. Hoje sou um homem mais feliz e mais realizado – completei minha primeira Maratona. O curioso dessa história: na minha cidade natal, minha (?) Curitiba, que nunca vivi, mas que jamais esqueci, que jamais esquecerei.

Abraços
Faraco